Pesquisa quer provar que velhice pode ser só estado de espírito

Desde primeiro de julho de 2018, a Universidade Católica do Sagrado Coração de Milão desenvolve um estudo que procura responder a uma pergunta diante da qual muitos de nós gostaríamos de ouvir um sim: “minha mente pode ser usada para me tornar mais jovem?” Em busca de uma resposta, o professor Francesco Pagnini recrutou 90 pessoas com mais de 75 anos e dividiu-as em três grupos.
Um terço continuou a levar sua vida normalmente; outro terço ficou em suas casas, sem mudanças maiores no cenário e na rotina. Já o terceiro grupo teve suas casas e rotinas modificadas, de modo a simular um mergulho radical e profundo no ano de 1989, quando os participantes tinham por volta de 46 anos. Naquele momento, caia o muro de Berlim, Fernando Collor de Mello era eleito presidente do Brasil na primeira eleição direta pós-ditadura, o Bateau Mouche naufragava na baía de Guanabara, centenas de pessoas eram mortas num protesto na Praça da Paz Celestial na China, Que rei sou eu era ao sucesso da TV, Emerson Fittipaldi conquistava a Fórmula Indy, Ayrton Senna rivalizava com Alan Prost na Fórmula Um e a World Wide Web acabara de ser criada…
Cada participante será avaliado quatro vezes quanto à aparência médica, cognitiva, psicológica e de idade: no recrutamento, após a intervenção e novamente após 6 e 12 meses. O plano de pesquisa indica junho de 2020 como data prevista para o término do trabalho.
No sumário da pesquisa, o professor Pagnini antecipa que os resultados “poderão promover uma mudança de mentalidade não apenas nos participantes, mas na população em geral” e explica que o plano de comunicação inclui a apresentação dos resultados às comunidades e associações de idosos, usando o experimento como uma prova de conceito. Ele deverá demonstrar que “desafiar estereótipos rígidos, culturalmente motivados e relacionados à idade pode resultar em melhoria da saúde e do bem-estar”.
Registre-se que o trabalho de Milão é a reedição de uma experiência realizada em New Hampshire, em 1979, por Ellen Langer, 72 anos, a primeira mulher formada em Psicologia em Harvard. Langer colocou oito idosos num convento que, de certo modo, funcionava como uma máquina do tempo, com todas as referências ligadas a 1959: a voz de Perry Cuomo saindo de um rádio vintage, Ed Sullivan na telinha preto e branco da TV, livros e jornais da época e assim por diante.
Mais que relembrar o passado, os participantes foram instruídos a se comportar como se realmente fosse 1959, enquanto o grupo de controle vivia num ambiente similar, mas sem agir como se tivessem voltado no tempo.
Resultado: depois de uma semana, 63% dos “viajantes no tempo” obtiveram melhores resultados num teste de inteligência, contra 44% no grupo de controle. Quatro voluntários independentes, que não sabiam nada sobre o estudo, analisaram fotos feitas antes e depois e concluíram que as imagens do pessoal “depois” eram em média duas anos mais novas que as do “antes”. No último dia, velhinhos que tinham chegado quase se arrastando, disputaram uma partida improvisada de futebol americano no gramado em frente ao convento.
No livro que apresentou os resultados do experimento, Counterclockwise, Langer assegura que tanto o grupo de controle quanto o grupo experimental mostraram melhorias em “força física, destreza manual, marcha, postura, percepção, memória, cognição, sensibilidade gustativa, audição e visão.”
A experiência tem seus críticos, que nela vêem apenas o efeito placebo, mas Ellen Langer continua insistindo que a atenção plena (mindfulness), que pode ser obtida pela meditação e por exercícios específicos, tem um poder imenso, muitas vezes desprezado e garante que “muitas consequências da velhice podem ser ambientalmente determinadas e, assim, potencialmente revertidas pela manipulação do ambiente.” Seu experimento acabou inspirando uma conhecida série de TV da BBC, que reuniu seis celebridades dos anos 70 em situações semelhantes, tendo a própria psicóloga como consultora.
Agora, a repetição do experimento deve permitir aferir seus efeitos com a precisão que a tecnologia do século XXI oferece e sem a embalagem televisiva, embora o professor Francesco Pagnani seja um abnegado integrante da equipe de Ellen Langer.