Pesquisadoras brasileiras alertam para urgência de cuidar dos lares de idosos na pandemia
O coronavírus tem algumas preferências para contaminar e vitimar humanos – e uma das mais óbvias são o que o Brasil resolveu chamar de instituições de longa permanência – os antigos asilos ou lares de idosos. Se não há dados confiáveis sobre o avanço da pandemia no país, menos ainda são as informações sobre esse segmento, que abriga menos de 1% de nossos velhos.
Em artigo apresentando na Geriatrics Gerontololy and Aging, publicação científica trimestral da Sociedade Brasileira de Gerontologia, Helena Akemi Wada Watanabe, Marisa Accioly Rodrigues da Costa Domingues e Yeda Aparecida de Oliveira Duarte reclamam uma ação imediata nessas instituições: “Nós estamos gritando pela atenção a essas pessoas que, em sua maioria, não podem mais gritar por ajuda e estão esquecidas nesses locais. Faz-se imprescindível uma ação imediata, pois elas não possuem reserva para resistir sem ajuda. Isso ocorre de forma especial nas instituições pequenas, muitas delas ilegais e desconhecidas. Existem em todo o país e precisam ser vistas e ajudadas nesse momento”.
As pesquisadores lembram que o Censo realizado há uma década pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada indicou a existência de cerca de 90 mil idosos vivendo nas 3.600 instituições do gênero no pais – a maioria (65%) filantrópica)Um inquérito nacional realizado entre 2016 e 2018 concluiu que havia aproximadamente 51 mil velhos vivendo em instituições públicas e filantrópicas do país, sendo 65% semi-dependentes ou dependentes e, portanto, frágeis; hoje esse número pode chegar a 78 mil, calculam.
As instituições semelhantes nos Estados Unidos estão obrigadas, a partir desta terça-feira, a testar suas equipes e oferecer testes aos residentes. Os resultados deverão ser compartilhados com o governo e com os hospitais. Em julho, o governo comprou mais de 750 mil testes para serem distribuídos aos lares de idosos. Além disso, a administração Trump liberou US $ 5 bilhões adicionais de um fundo federal para ajudar essas instituições na pandemia.
Algumas instituições estão testando um anticorpo que pode evitar a contaminação dos idosos que vivem nesses locais. Isso já aconteceu no Heartland Health Care Center, uma casa de repouso em Moline, Illinois, uma das primeiras instituições a ser incluída nesse experimento. Tudo começou no último dia do mês passado, quando um membro da equipe de enfermagem testou positivo. No dia seguinte, um supervisor de enfermagem da instituição ligou para o laboratório Eli Lilly, que estava em busca de teste para um anticorpo monoclonal desenvolvido a partir do sangue de um sobrevivente da Covid 19. Um medicamento caro e difícil de produzir.
Mais 24 horas e dois veículos do laboratório estacionavam em frente à casa de repouso: um caminhão levando cadeiras especiais, suporte para bolsas de infusão, mesas de cabeceira e telas de privacidade. No outro, havia uma espécie de laboratório móvel com freezers, centrífuga e computadores.
A sala de jantar da instituição virou um mini-hospital, onde 25 dos 80 residentes (os que concordaram em participar voluntariamente) foram incluídos no experimento. Os velhos não sabem se estão recebendo o tal anticorpo monoclonal, desenhado para se prender ao vírus e bloquear sua entrada nas células, ou um placebo. A droga precisa ficar entre um e três meses no corpo dos participantes. O mesmo estudo está sendo realizado em outros lares de idosos nos Estados Unidos. O laboratório quer inscrever 2.400 residentes e funcionários e já tem 125 concordâncias.
O doutor Myron Cohen, pesquisador da Universidade de Carolina do Norte, que propôs o ensaio e foi entrevistado pela repórter Gina Kolata do New York Times explica sua motivação: “Algumas pessoas perguntam: ‘Se temos uma vacina, por que fazer isso? Mas uma vacina leva um mês para produzir anticorpos, e algumas populações precisam de uma intervenção mais emergente.”
O dr. Cohen ficou impactado com os relatos de moradores infetados morrendo sozinhos, sem que as visitas fossem permitidas e com o avanço da doença sobre as equipes clínicas: “Os executivos das casas de saúde estavam ansiosos para participar do estudo. No final das ligações, fiquei muito abalado, Eles explicaram o sofrimento inacreditável de clientes e famílias.”
Este é o último texto do blog na Folha de S. Paulo. O primeiro foi publicado em 12 de fevereiro de 2019 e falava de uma pequena cidade italiana cujo prefeito queria criar uma vila de aposentados de todo mundo – bem antes da pandemia. O autor agradece a acolhida do jornal neste período e seguirá acompanhando o tema, já que este é seu lugar de fala, como dizem…